segunda-feira, 19 de abril de 2010

[uma loira em áfrica] vamos às compras



E se de repente, no meio da savana, a assaltar o vírus do armário vazio, vulgarmente designado por "ai que não tenho nada para vestir hoje"? E se essa doença não fica devidamente tratada e evolui para "ai que gostava tanto de ter uns trapinhos iguais aos da Maria Francisca, que lhe ficam tão bem"? Pois... isto do voluntariado e do em-roma-sê-romano é muito bonito e na esmagadora maioria dos dias funcionava, mas consigo recordar-me nitidamente de uma ocasião em que a loira que há em mim saltou cá de dentro.

E então aconteceu. Foi no Gilé, Zambézia. No meio do mato. Abril de 2008. Saí do hospital à hora de almoço e fui às compras ao mercado. Qual não foi o meu espanto quando dei de caras com várias mamãs do hospital, que tinham tido a mesma ideia que eu (nada de extraordinário haveria nisto, não fosse dar-se o caso de estarem internadas...). Sorri-lhes vagamente, sem saber se as havia de cumprimentar ou dar-lhes um raspanete por terem saído do hospital... E comprei o que havia para comprar: capulanas. Felizmente eram bonitas (as mais bonitas que tenho, aliás) e no dia seguinte fui trabalhar de alma lavada.

Quando apareci de capulana no hospital no dia seguinte, ouvi alguns risos e um coro de vozes brancas a dizer qualquer coisa em macua que não percebi. Voltei-me para as crianças e perguntei-lhes de que se riam. Respondeu-me uma das mais velhas:
- Estão a rir porque não sabiam que a doutora também é mulher!
(Lindo, pensei, para estas crianças só é mulher quem usa capulana! E até me ir embora tive sempre esta desculpa fantástica para comprar mais capulanas e andar sempre vestida com panos coloridos. Para não confundir as crianças...)

2 comentários:

  1. As suas estórias são maravilhosas.

    Sorvo-as com saudade, e devagar, devagarinho.

    Continue, p.f. .

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  2. Obrigada também! Escrevo-as certamente tão devagar como as lê e pela mesma razão... Volte sempre.

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