terça-feira, 4 de outubro de 2011

[improbabilidades] treinar a condução em picada... em lisboa


Iapala há alguns anos atrás...
(Nampula, Moçambique)

Quando lá estive em missão, há uns anos, Iapala era África profunda. Ainda é. Mas quiçá um pouco menos... Na altura não tinha rede de telemóvel, não tinha estradas. A única casa com água canalizada e electricidade era a das Irmãs. Nem o hospital, que ficava mesmo em frente à nossa casa, tinha água canalizada.

Na véspera de uma ida à cidade, uma das meninas de quem as Irmãs tomavam conta caiu doente com malária cerebral e precisava de alguém para cuidar dela 24 horas por dia. Só com mais outra Irmã na Missão era impossível dispensar mais alguém nos dias seguintes. E foi assim que na manhã da partida ficou decidido que eu iria a Nampula… sozinha.

Fiquei em pânico. Eu tinha tirado a carta de condução poucos meses antes, no último ano do curso, e mal tinha tido tempo ainda para praticar no meu pequeno Ford em cidade, quanto mais num jipe 4x4 no mato. Se bem que me tinha tentado preparar...

Em Lisboa, na minha escola de condução tinha tido um instrutor bem-disposto e com um sentido de humor muito peculiar, natural da Guiné-Bissau, a quem tinha pedido especificamente que me preparasse para condução em picada. Claro que era ingenuidade minha. (Loiras…) Ficaria tão habilitada para conduzir em picada treinando-me no centro de Lisboa como uma adolescente ficaria preparada para os jogos olímpicos de natação aprendendo a nadar… digamos, num lagar de azeite! Mas enfim, como ele próprio dizia, quem não tem cão caça com gato, e lá me levou para o local próximo de Campo de Ourique mais parecido com uma picada africana de que se lembrou: o bom velho Casal Ventoso. Um dos piores ghettos de droga, habitação precária e miséria humana de Lisboa… Um ghetto já muito reconvertido, é certo, e com a maioria das pessoas realojadas, mas ainda assim tenebroso e assustador...

E no meio de esgotos a céu aberto, toxicodependentes e traficantes de droga, tinha ficado apta a fazer inversões de marcha em tempo muito razoável para quem tem um toxicodependente com mau aspecto a rondar a porta do carro, a arrancar numa subida em menos de um ai, a fazer pontos de embraiagem bastante bem, sobretudo se visse alguém por perto, e a sair dos buracos onde seria mais improvável cair. Mas não me achava minimamente capaz de conduzir o enorme e pesadão jipe das Irmãs, ainda para mais com o volante e as mudanças no lado oposto…

(continua)

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