(continuando)
- Mas a Irmã tirou a carta em Nampula, é diferente, estava mais preparada para conduzir no mato…
- Qual quê! Queres que te conte? O carro de instrução de Nampula na altura só tinha três mudanças. A primeira, a segunda e a marcha-atrás…
- Está a brincar comigo?
- Claro que não. Era um desespero… O carro só pegava de empurrão. E nos dias maus só pegava nas descidas. Tinha de levar o guarda lá de casa para empurrar o carro, porque se não houvesse mais ninguém era o instrutor quem tinha de o empurrar e eu não conseguia meter as mudanças sozinha.
- Como?!
- Bloqueavam. As mudanças bloqueavam. Mas ele tinha um truque para as pôr a funcionar novamente. E os travões? Bem, nem queiras saber! Eram um susto. Havia momentos em que o carro não travava de maneira nenhuma e ele tinha de me ajudar e puxar o travão de mão com as duas mãos. As pessoas quando viam o carro de instrução fugiam. Se estivessem a atravessar uma rua voltavam para trás assim que nos avistavam. Mesmo as crianças! As mamãs deviam ensinar-lhes que aquele sinal no tejadilho era um grande perigo. Nem sei como nunca houve nenhum acidente…
- Credo!
- Bem, depois de aprender a conduzir aquele carro, qualquer outro era uma maravilha.
- Pois, imagino… Mas ainda existe esse carro?
- Existia até há cinco ou seis anos atrás. A Irmã Sunita ainda fez exame de condução nele quando veio da Índia, há dez anos atrás. Ela não sabia conduzir, mas tínhamos muita pressa que ela viesse para aqui porque tinha de começar a dar aulas na semana seguinte, portanto apresentou-se a exame como se já soubesse conduzir.
- Mas isso é possível?!
- Sim, aqui existe essa modalidade para os estrangeiros…
- Mas como é que teve coragem de se apresentar assim? E passou?
- Oh… – encolhendo os ombros – O que é que ela ia fazer para a escola de condução? Não ia lá aprender nada, só lá ia perder tempo. E passou! Eu ensinei-lhe no mesmo dia a meter a primeira e arrancar com o carro e fui com ela assistir ao exame. Ela nem nervosa ia. Se passasse tanto melhor, se não, paciência, ficava para a próxima.
- Inacreditável… Mas ela só com uma explicação de uma manhã conseguiu aprender a conduzir o suficiente para passar?!
- Claro que não! O exame foi do mais caricato que pode haver. Entrámos no carro com o examinador à frente e o instrutor e eu no banco de trás. Ela ligou o carro, meteu a primeira e conseguiu arrancar. Foi sorte de principiante. Mas deixou logo o carro ir abaixo. Isto no meio da avenida 25 de Setembro. E ali ficámos.
- E então?
- Então, passado alguns momentos, o instrutor diz-lhe: “Irmã, o carro parou!”, assim como se só ele é que tivesse dado conta. E ela, muito calma: “Sim, isso eu estou a ver, senhor examinador...”
- Lindo! E ele?
- Ficou atrapalhado… Ele, de facto, não sabia o que fazer. E às tantas perguntou-lhe: “E então, como pode resolver a situação?” “O que é que quer que eu faça?”, ela muito indignada, “O carro já não anda!” E era verdade. Ela não ia ser capaz de pôr o carro a funcionar outra vez… Havias de ver o espectáculo. Nós o quatro dentro do carro e os outros carros todos a apitar atrás de nós, os dois homens cada vez mais nervosos com aquela situação e nós como se não fosse nada connosco. O examinador tentou meter ele próprio a primeira para ver se ao menos saíamos dali, mas também não foi capaz. Quem conhecia os truques do carro era o instrutor. E esse não estava autorizado a fazer o que quer que fosse nos exames de condução…
- Ai, valha-me Deus!
- Pois… então, depois de esperarmos dentro do carro, com um calor infernal lá dentro, toda a gente a apitar atrás de nós, já um enorme engarrafamento na avenida, eu disse-lhes: “Os senhores têm de empurrar o carro para ver se ele pega.” E portanto o exame acabou assim, com o examinador e o instrutor a empurrar o carro e o carro sem pegar, isto em pleno Dezembro, na hora do calor. Os dois homens transpiravam por todos os lados, os outros carros continuavam a apitar e a fazer-nos rasantes… Uma situação totalmente inédita. A meio da avenida eu abri a janela, meti a cabeça de fora e disse: “Ela vai parar aqui mesmo! Estaciona e pronto, que os senhores já estão cansados.”
- Mas que grande lata! E eles?
- Eles agradeceram, claro! Ela virou o volante, encostou o carro e pronto. Terminou o exame.
- Nem posso acreditar! E passou?
- Claro! Nem coragem tiveram de a chumbar.
- Lindo!
E pronto, foi com esta história que a Irmã me convenceu a ir sozinha para Nampula...
(continua)
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