domingo, 16 de outubro de 2011

[de iapala para nampula] o carro dos loucos...

(continuando...)

Ainda íamos a um quarto do caminho e já o Sr. Cachimbo, frustrado de ver todas as suas investidas chutadas para canto pela bebedeira monumental do Sr. Rafael, começava a responder-lhe cada vez com maior azedume. Eu ia ver-me aflita se começassem a agredir-se verbalmente.

Aquilo parecia uma comédia de loucos com cenas de filme de terror, sobretudo a partir do momento em que, depois de uma curva, caímos num buraco que não consegui ver a tempo. O Sr. Rafael estava de pé naquele momento e caiu para a frente, entre os dois bancos dianteiros e agarrou-se com toda a força das suas unhas ao meu braço esquerdo, para não bater no pára-brisas e depois começou a rir-se sem conseguir parar, a gozar com a minha falta de jeito. O Sr. Cachimbo resolveu que a melhor maneira de mostrar o seu cavalheirismo era pregar-lhe um valente murro no braço! Ai, valesse-me Santa Rita de Cássia, que agora é que estava tudo perdido! A minha sorte foi que o Sr. Rafael, alcoolizado como estava, não sentiu qualquer dor e continuou naquele riso grotesco, sem devolver a agressão.

Estávamos em perigo. Parados no meio da estrada imediatamente a seguir a uma curva, caídos num buraco, sem maneira de sair dali rapidamente se viesse um chapa disparado. Mas eu estava prestes a explodir:

– Senhores, comportem-se que estão com uma senhora! Mais uma dessas e ficam já aqui, voltam a pé para Iapala, que eu não transporto homens violentos!

Eles calaram-se de repente e eu consegui voltar a focar-me no carro. Mesmo sem a tracção saímos sem dificuldade do buraco [afinal a instrução no Casal Ventoso não tinha sido só um exercício de estilo, o meu instrutor afinal era capaz de ter merecido cada uma das aulas suplementares que lhe tinha pago], mas com o susto, a irritação e o nervosismo, parecia-me que o carro tinha deixado de responder da mesma maneira. Fugia nas curvas, parecia que tinha a direcção desalinhada, que não me obedecia tão prontamente. Até a direcção me parecia mais pesada… E eu sem ter em quem confiar para partilhar esta impressão de que se passava qualquer coisa com o carro. Ou comigo, não sabia dizer bem… Via-me obrigada a ir a quase metade da velocidade e comecei a ficar em pânico de encontrar outro chapa e não conseguir fugir a tempo para a berma da estrada. Mas àquela velocidade nem à meia-noite chegaríamos à cidade… Sentia que estava a perder o controlo do carro e da situação dentro dele.

Era inenarrável a minha sensação de isolamento e abandono naquele momento, longe de tudo, incontactável, cansada e quase desnorteada, a pensar no pior que nos podia acontecer e quase arrependida de ter aceitado meter-me à estrada sozinha… Ou pior ainda, sozinha com um bêbado e com um chato…

(continua...)

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