Esta semana, na Gulbenkian, durante um concerto particularmente feliz dirigido por Ton Koopman, um senhor já de certa idade, ao meu lado, cabeceava, lutando com pouca convicção contra o sono. Percebi que ele só podia ser músico [depois confirmei que era maestro] porque só acordou estremunhado duas vezes, e levantou a cabeça muito indignado por ter sido interrompido à traição no sono dos justos, a primeira vez quando o barítono deu uma nota ao lado e a segunda quando o cravista tocou três notas seguidas fora de tom.
Tive alguma dificuldade em voltar a concentrar-me no concerto porque só me lembrava de uma cena mais do que caricata que me aconteceu há dois anos [ou já terá sido há três?] no São Carlos, durante uma ópera de Wagner [o Siegfried], em que eu e o senhor ao meu lado na plateia, que eu não conhecia de lado nenhum, dormimos durante mais de metade do segundo acto.
Primeiro um cabecear envergonhado, depois um sono mais solto no meu caso, um roncar tímido, mas rítmico no caso do meu companheiro. Por fim, acabámos por assumir que era preciso dormir um bocadinho para estarmos frescos nos actos seguintes e colocámos dois casacos no apoio de braços das cadeiras entre nós e, depois de alguns "mas esteja à vontade" e "faça favor", lá adormecemos em grande estilo, quase encostados um ao outro.
De vez em quando ele levantava ligeiramente a cabeça, olhava para o palco e aninhava-se outra vez, enquanto comentava para mim: "Eles têm uma resistência... Já estamos há duas horas nisto... E ainda faltam mais quantas?" "Mais quatro", respondia eu, e sucumbíamos ao sono novamente. A cada mudança de registo ou frase mais enfática lá levantava ele outra vez a cabeça: "Eles têm uma resistência!"
Drª., respeitinho de quando falara/escrever sobre o Tom Koopman :-)
ResponderEliminarhttp://www.youtube.com/watch?v=PhRa3REdozw
Bem, se a obra não fosse boa, nem para dormir dava, certo? :D
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