quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

[casa do gaiato] o centro de saúde


(continuando...)

Foi uma experiência apaixonante, trabalhar no Centro de Saúde da Casa do Gaiato com os outros profissionais, que eram pessoas com muito pouca cultura médica ou científica, mas a maior parte deles com experiência clínica e muito bom senso.

E, como se não bastasse ter começado do zero na Medicina Tropical, ainda havia a barreira da língua (o dialecto Changana é absolutamente impenetrável e dificílimo) mas que se resolveu em grande estilo: colocaram à minha disposição uma intérprete fantástica, a Inês de Maria, que para além de tradutora e mediadora cultural, tinha um sentido de humor e uma boa disposição a toda a prova e adaptava as minhas perguntas desastradas à realidade local. Ainda hoje sorrio quando me lembro que quando perguntava aos doentes em que suspeitava de imunodeficiência se alguma vez tinham tido candidíase orofaríngea e explicava: “assim pequenas placas tipo iogurte”, ela, imperturbável, traduzia iogurte para “coco ralado” ou “mandioca cozida”, traduzia as minhas recomendações de “não fazer esforços” para “não deve pilar milho nem trabalhar com enxada”... Ou quando comecei a compreender um pouco do dialecto, uma vez uma senhora queixou-se que a filha de sete anos tinha a “dor do mês”.

Com sete anos já é menstruada? – perguntei, abismada, ainda para mais porque a menina não aparentava sequer ter sete anos, mas apenas cinco ou seis.

Não, não é menstruada – assegurou-me a Inês, o que ela disse é que a menina tem epilepsia, aqui as pessoas chamam-lhe tradicionalmente a “doença do mês” ou a “doença da lua”...

(continua...)

2 comentários:

  1. Nã deve haver maior recompensa que trabalhar com crianças. Neste caso, ainda mais pois são crianças carenciadas e com grandes problemas.
    Leio-te com muita admiração e até alguma inveja (da boa) pela coragem e dedicação que tens àquele povo.
    Um grande beijinho

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  2. Obrigada! O dia-a-dia é que requer força e coragem, não são estes dias em que tudo parece fazer sentido...

    (um) beijo de mulata

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