quinta-feira, 22 de novembro de 2012

[as melhores do serviço de urgência] reanimação!

Há alguns meses, no final de uma manhã de trabalho na urgência de pediatria, ouvimos o telemóvel da reanimação tocar, com o seu toque estridente e propositadamente irritante para que ninguém o confunda com o seu próprio toque e inadvertidamente o desligue. Desligar o telefone da reanimação é, diga-se de passagem, um acontecimento altamente improvável para quem for minimamente atento, mas lá pelas quatro da madrugada, antes do pico do cortisol, nunca se sabe, há gente que pode não responder por si... Mas como eu ia dizendo, era o fim da manhã, quase hora da passagem de turno, e o som do telefone ecoou pelo corredor. O semblante de todos carregou-se de repente, atitude em sentido, ritmos cardíacos a galope... Quem seria desta vez? O chefe de equipa tirou o telefone do bolso da bata e atendeu:

- Estou! - E escutava em silêncio. Do outro lado ouvia-se alguém a falar muito exaltado e o meu chefe ouvia, de sobrolho cada vez mais carregado.

A seu lado, nós já estávamos organizados: quem vai ajudar na reanimação, quem fica a assegurar a urgência, quem vai já abrir a porta com código e desimpedir o caminho. Esperávamos apenas que nos dissesse para onde era suposto corrermos. Mas o telefonema demorava e durava. Do outro lado, a pessoa que falava não se calava. O que se passaria? O telefone da reanimação é sagrado, nunca se usa para conversas casuais ou informais. Algo de grave se passava, pela cara do meu chefe... Até que...

- Ah, és tu, Igor? Tem calma que ninguém te faz mal. Onde estás é tudo boa gente, acredita, mas se for preciso vamos lá, claro. - E desligou.
- Então, chefe?
- Era o Igor, o adolescente que tivemos aqui ontem internado com uma crise psicótica. Diz que o prenderam na enfermaria e que o querem envenenar. Por isso ligou para a reanimação para estarmos preparados. Quando ele for envenenados já sabemos do que se trata e vamos logo lá!
- Pronto, pelo menos confia em nós, chefe!
- Pois, nada mau, já deve estar melhor, que ontem não confiava em ninguém e os amigos dele vinham cá buscá-lo de helicóptero.
- Ah, sim, pois foi - respondeu o chefe -, ele também disse para ligarmos para os amigos dele. Começou por dizer que só ligou para nós porque é o único número desbloqueado da enfermaria!

Pronto. Mais uma dica para o meu "Manual Prático para Dar com uma Equipa Médica em Doida no Internamento". Para dar com uma equipa de enfermagem em doida ver aqui.

2 comentários:

  1. A junção doidos + urgência é um regalo em qualquer lado, em qualquer hospital, seja em pediatria ou geral. :)

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  2. Pelo menos nunca têm dias (noites) monótonos, pois não?
    vidademulheraos40.blogspot.com

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