sexta-feira, 30 de novembro de 2012

[sagrada família] da bicicleta

 
Sagrada família da bicicleta.
Presépio Irmãos Baraça.

 
Família na bicicleta, Moçambique.
Imagem deliciosa daqui.

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

[histórias do baby-de-mulata] maturidade


O baby de mulata, devido a várias doenças no primeiro ano de vida, começou a andar há pouco mais de um mês... Mas, como qualquer criança com mais de um ano e meio, está em plena fase do negativismo. Diz que não a tudo, nunca se quer vestir, não se quer despir, não me quer dar a mão na rua, procura explorar (quase com método científico!) o que sabe que é proibido, e foge num passo trôpego, o mais rápido que consegue, quando lhe digo que vamos vestir, ou mudar a fralda, ou comer... ou o que quer que seja, desde que lhe dê para isso.

O grande problema é que esta diferença entre as capacidades físicas e a maturidade resultam em quedas, tropeções, arranhões, galos, hematomas e o diabo a quatro (pronto, pronto, sobre isto já falámos, não me vou repetir a teorizar sobre com quantos diabos ficamos se começarmos com quatro). Geralmente as marcas de guerra são em locais bem visíveis. Há tempos, andou mais de quinze dias com o olho "à Belenenses" depois de me ter tentado fugir na hora do banho e ter batido com o canto do olho na banheira...

As pessoas olhavam para ele na rua e vinham ter comigo para me dizer: "Que grande queda, foi um acidente muito mau, coitadinho! Os meus nunca tiveram nada disso..." E só me apetecia responder: "Não, não vê que não foi nada disso? Andou foi a digladiar-se com um colega na escola e o outro ainda ficou pior do que ele!" Mas calava-me, pronto.

Ontem, dei por mim a pensar que é terrível este desfasamento entre a maturidade e as capacidades físicas... Mas depois lembrei-me que na adolescência acontece precisamente o oposto e que ainda vou achar que ele era um santo nesta idade. E, pronto, mudei de assunto e assobiei para o ar....

quarta-feira, 28 de novembro de 2012

[moçambique no seu melhor] o segredo da felicidade...

 
Que delícia, a "Casa do Liga Mais Tarde"! E calculem também que esta casa nos revela que o segredo da felicidade está numa barriga cheia.
(Quissico, Inhambane)
 

segunda-feira, 26 de novembro de 2012

[alhos e blogalhos] valha-me nossa senhora do google


Meus queridos amigos, eu não gosto de vos importunar com "bloguices" aqui do mato, até porque qualquer vizinho de morada do blogspot também deve ter histórias igualmente engraçadas...

A verdade é que hoje venho aqui carpir as minhas mágoas. Muito me agradaria continuar a dizer que a maioria dos visitantes que aqui desagua, navegando à boleia do google, vem à procura de "mulatas nuas" e de "mulatas selvagens", mas infelizmente, nos últimos tempos, o top 10 das pesquisas tornou-se, lamentavelmente, mais educado e decente. Eu sempre confiei que o nome deste mato pudesse atrair para sempre pesquisas mais interessantes, mas parece que já não conseguimos enganar ninguém...

O que ainda me vale, para animar o sitemeter, são os senhores que têm a bússola cibernética avariada e vêm naufragar aqui ao mato com pesquisas que não lembram ao menino Jesus.

Ora então temos as últimas pesquisas pertinentes que vieram aqui aportar:

- Imagens de Santo Mé e Príncipe (!) - Oh, valha-me São Mé, santo padroeiro dos ovinos e caprinos, segundo o nosso comentador honoris causa.

- Lista de todas as vadias de Nampula até Cuamba - Credo, ó senhores... Mas precisava mesmo de ser uma lista de todas, todas? Se fosse assim umas quatro ou cinco ainda se conseguia arranjar. Eu própria conheci e tratei algumas no hospital de Iapala e ainda me recordo dos nomes, mas mais do que isso não conseguimos. De qualquer modo, aqui ficam os meus sinceros parabéns pelo otimismo! Acreditar que é possível, num qualquer recanto blogosférico, encontrar uma lista deste calibre é algo digno de um homem de fé!

A Santa do Eixo da Via - Ora que bela ideia! Deve ser a santa padroeira dos chapas! Eles andam a velocidades suicidas sem nunca se desviarem um milímetro do meio da estrada. E nós, os condutores com algum apego à vida, acabamos por ir parar à berma o mais rapidamente possível, mesmo arriscando a pele no voo lateral...

- Pode-se tomar pau de cabinda com o mata-bicho? - Bem, poder pode. Com o mata-bicho, com uma cerveja, com um café... Mas com a namorada penso que seria mais agradável. Mas cada um sabe de si.

- Baptiza Qualquer Rato - Meu senhor, não vejo por que não! Que mal pode haver nisso? Qualquer rato também é filho de Deus e produto da Sua divina criação, passe o pleonasmo. Em tempos houve um bispo em Utrecht que chegou a batizar uma mola hidatiforme! Uma mola hidatiforme de uma condessa, é certo, mas ainda assim... E aqui a história assevera-nos, mais uma vez, que um bispo nunca se atrapalha, que um bispo enrascado é pior que um anestesista bêbado. E reza, pois, a história que o digníssimo clérigo dividiu aquela massa vesiculosa em 365 partes iguais e batizou metade com o nome de João e a outra metade com o nome de Isabel e mandou depois fazer-lhes um funeral condigno.

- Banhos para atrair mulheres funcionam mesmo? - Por acaso esta já tinha aparecido antes... Bem, meus senhores, estudos científicos por acaso não temos. Mas temos uma teoria ...

Afinação para vinte vozes brancas - Ai, meu amigo, deixe-se disso... Esqueça! Mesmo. Dedique-se a outra coisa. Vai ser uma canseira sem proveito nenhum. O próprio Bach nunca passou da afinação para quatro vozes. E mesmo assim sabe Deus!

A todos estes senhores, que conseguiram cá chegar com apenas estas coordenadas, os meus parabéns e o meu mais sincero obrigada pelos sorrisos que me proporcionaram!

domingo, 25 de novembro de 2012

[bloguismo] ontem conheci a patanisca!

Ontem fui ao evento "Há festa no Palácio", no Palácio Foz, lindo e cheio de gente... A minha editora tinha-me convidado para lá ir dar alguns autógrafos do meu livro e, ao mesmo tempo, chegou a Sónia Pereira, a autora d'As Receitas da Patanisca, que recentemente lançou um livro: 234 Receitas para Robôs de Cozinha...

Amorosa, recebeu-me como se já nos conhecêssemos há séculos! Falou-me da sua atividade profissional como psicóloga numa escola no [inegavelmente problemático!] bairro do Picapau Amarelo, na margem sul. Alunos com perturbações do comportamento, famílias disfuncionais, violência domestica, agressões a professores, tentativas de suicídio e o diabo a quatro (ou a sete, que já sabemos, e costumamos teorizar desde que este blogue é blogue, que um diabo nunca vem só, quanto mais quatro diabos e, bem vistas as coisas, começando com quatro diabos, se eles acabarem por ser só sete, já é muito bom, mas adiante), tudo o que se pode pensar que pode existir de mau numa escola num bairro problemático lhe tem vindo parar em mãos...

Contou-me que, apesar de ter um contrato de apenas um ano, iniciou um projeto fantástico com os alunos, que inclui workshops de culinária como prémio para os que não têm faltas disciplinares ou participações. Com o projeto (inteiramente financiado por ela, que um contrato a termo certo não se compadece com os tempos das burocracias e das respostas da Câmara Municipal) entretanto já conseguiu que os miúdos ganhassem imenso em termos de auto-estima, autonomia e organização. Alguns descobriram que afinal sabem fazer contas e regras de três, que na sala de aula não conseguiam aplicar. Muitos alunos melhoraram o comportamento para poderem ter acesso aos workshops.

E, melhor do que tudo, neste contexto, conseguiu chamar muitos pais para a escola, para revelarem segredos das cozinhas dos respetivos países. Para muitos, foi a primeira vez que entraram na escola dos filhos (a maioria recusa-se a comparecer se for chamada para "ouvir dizer mal dos meninos") e claro que ela aproveitou para os colocar ao corrente da situação das suas crianças e dos problemas que os incapacitam.

Uma ideia genial posta em prática por uma pessoa especial! Parabéns, Patanisca!

[improbabilidades] o presépio

 
Presépio de Machado de Castro
Séc. XVII - Barro Policromado

A propósito do recente desaparecimento da vaquinha e do burrinho do presépio, já em tempos vos tinha citado esta frase brilhante do Brideshead Revisited:

The gospel is simply a catalogue of unexpected things. It’s not to be expected that an ox and an ass should worship at the crib. Animals are always doing the oddest things in the lives of the saints. It’s all part of the poetry, the Alice-in-Wonderland side, of religion.
Lady Marchmain in Brideshead Revisited

sábado, 24 de novembro de 2012

[as melhores do serviço de urgência] drogas legais


A propósito do caso do post anterior, gostaria de referir que o adolescente que foi internado com uma crise psicótica aguda nos deu água pela barba durante horas seguidas. Isto porque a história que a mãe nos contava era que o filho entrara em psicose completamente "do nada", depois de uma saída para a discoteca com os amigos. Mas os delírios com helicópteros e envenenamentos - perfeitamente banais em contexto de psicose - eram acompanhados de uns, não tão banais assim, suores, arritmia, hipertensão e pupilas dilatadíssimas, o que nos fazia pensar que havia algum consumo ilícito por ali. Mas a mãe jurava, com quantos dentes tinha (embora já não tivesse assim tantos), que o filho jamais-seria-capaz-de-tocar-em-drogas-que-um-raio-fulminasse-já-ali-a-vaquinha-e-o-burrinho-do-presépio (o menino Jesus e a sua mãe claro que não, que blasfémia!) e, de facto, a pesquisa de drogas na urina e no sangue acabou por vir toda negativa.

Depois de o estabilizar, já nos preparávamos para avançar nos exames dirigidos para doenças muito mais improváveis, quando a mãe nos veio dizer que os amigos, aflitos com o que se passava, lhe tinham confessado que haviam experimentado "miau-miau". Mas que apenas o Igor Joaquim tinha ficado assim "mais estranho"... [Mas, claro, o que é que esperavam de um Igor Joaquim? E mais uma vez se confirma a minha teoria sobre os nomes de mau prognóstico.]

Senti-me uma velha desdentada numa casa bafienta a cheirar a urina de gato. "Miau-miau"? Mas que raio seria o "miau-miau", valesse-me Nossa Senhora do Google? Ou S. Vito das Noites Brancas. O que tivesse mais força. Ou pelo menos o que me pudesse esclarecer minimamente...

Valeu-me a (inegavelmente virgem!) Nossa Senhora do Google, que me explicou que "miau-miau" era o nome dado popularmente a mefedrona, um fertilizante vendido legalmente em muitas lojas de plantas e que era consumido em larga escala por jovens como droga recreativa até ter sido recentemente tornada ilegal. Claro que não acusa em teste nenhum de pesquisa de tóxicos.

Rapidamente encontrei um site sobre os "cuidados a ter para tomar drogas legais de forma segura"! Isto é absolutamente inacreditável! Um site que dá dicas aos jovens, fazendo crer que é segura a toma de algo que lhes pode deixar sequelas para o resto da vida...

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

[as melhores do serviço de urgência] reanimação!

Há alguns meses, no final de uma manhã de trabalho na urgência de pediatria, ouvimos o telemóvel da reanimação tocar, com o seu toque estridente e propositadamente irritante para que ninguém o confunda com o seu próprio toque e inadvertidamente o desligue. Desligar o telefone da reanimação é, diga-se de passagem, um acontecimento altamente improvável para quem for minimamente atento, mas lá pelas quatro da madrugada, antes do pico do cortisol, nunca se sabe, há gente que pode não responder por si... Mas como eu ia dizendo, era o fim da manhã, quase hora da passagem de turno, e o som do telefone ecoou pelo corredor. O semblante de todos carregou-se de repente, atitude em sentido, ritmos cardíacos a galope... Quem seria desta vez? O chefe de equipa tirou o telefone do bolso da bata e atendeu:

- Estou! - E escutava em silêncio. Do outro lado ouvia-se alguém a falar muito exaltado e o meu chefe ouvia, de sobrolho cada vez mais carregado.

A seu lado, nós já estávamos organizados: quem vai ajudar na reanimação, quem fica a assegurar a urgência, quem vai já abrir a porta com código e desimpedir o caminho. Esperávamos apenas que nos dissesse para onde era suposto corrermos. Mas o telefonema demorava e durava. Do outro lado, a pessoa que falava não se calava. O que se passaria? O telefone da reanimação é sagrado, nunca se usa para conversas casuais ou informais. Algo de grave se passava, pela cara do meu chefe... Até que...

- Ah, és tu, Igor? Tem calma que ninguém te faz mal. Onde estás é tudo boa gente, acredita, mas se for preciso vamos lá, claro. - E desligou.
- Então, chefe?
- Era o Igor, o adolescente que tivemos aqui ontem internado com uma crise psicótica. Diz que o prenderam na enfermaria e que o querem envenenar. Por isso ligou para a reanimação para estarmos preparados. Quando ele for envenenados já sabemos do que se trata e vamos logo lá!
- Pronto, pelo menos confia em nós, chefe!
- Pois, nada mau, já deve estar melhor, que ontem não confiava em ninguém e os amigos dele vinham cá buscá-lo de helicóptero.
- Ah, sim, pois foi - respondeu o chefe -, ele também disse para ligarmos para os amigos dele. Começou por dizer que só ligou para nós porque é o único número desbloqueado da enfermaria!

Pronto. Mais uma dica para o meu "Manual Prático para Dar com uma Equipa Médica em Doida no Internamento". Para dar com uma equipa de enfermagem em doida ver aqui.

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

[eu vou!] há festa no palácio




A minha editora (Verso da Kapa) convidou-me para estar presente no evento "Há Festa no Palácio", no Palácio Foz, neste sábado pelas 16:00 para autografar o meu livro e eu aceitei de imediato (como não?).

Livros, peças de joalharia, decoração, fotografia, pintura, artesanato, roupa e outros artigos a preço de saldo. Todas as receitas revertem a favor de várias instituições, como a Ajuda de Mãe e a Fundação LVida, que apadrinha crianças em Moçambique. Fica a sugestão para este fim de semana.

terça-feira, 20 de novembro de 2012

[a riqueza] feliz dia mundial da criança!



 
 
As crianças são, no dizer do povo, a riqueza mais preciosa de Moçambique...
(Murrupula e Gilé, Zambézia)

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

[post atrasado] serviço público

Há algum tempo que ando para dizer isto... Agora já passou o timing, mas mais vale tarde que nunca.

Então mas aquela senhora cujos filhos usam um copo de água para lavar os dentes, em vez de água corrente, nunca ouviu falar da campanha "spit don't rinse", ainda mais amiga do ambiente e dos dentes saudáveis?

Pronto, era só isto. De nada. Um prazer fazer serviço público!

[moçambique no seu melhor] um curandeiro tentacular...

 
Um post novamente dedicado ao meu amigo com nome de filósofo (não, meus amigos, todos sabemos que não é o Sócrates!): já temos uso para dar ao polvo quando terminarmos os nossos dias, desiludidos com a vida e com o mundo, numa praia a fazer pesca submarina... Obrigada, Dr. Mwanachiipeta, pela inspiração* Seremos pescadores na maré alta e curandeiros na maré vaza!
Para variar não me recordo onde encontrei esta pérola. Se alguém souber que mande o link. Gracias.
 
* Ver penúltimo parágrafo do anúncio.

domingo, 18 de novembro de 2012

[angola no seu melhor] manter a compostura...

 
Um aviso emitido pelo Corpo de Segurança e Auto-Protecção do Ministério da Saúde no sentido de manter a moral, os bons costumes, o decoro e os ombros cobertos. Mas... alguém me explica o que são camisolas parte-escorno? Como é que uma pessoa sabe que está decente se nem sequer sabe o que não pode vestir?
Foto descaradamente reproduzida daqui...

sábado, 17 de novembro de 2012

[pode-se desidratar de tanta baba?] isto anda mesmo do piorio...

Então não é que ontem me mandaram o link de um artigo no Capeia Arraiana sobre o meu livro "A Missão"? Ainda para mais o Capeia Arraiana é um blogue que me toca profundamente porque versa sobre a terra da bisavó do meu baby-de-mulata, a mulher maravilhosa de que vos falei anteontem. O Sabugal é ainda sede da confraria mais improvável do país, a Confraria do Bucho Raiano, de que planeio fazer parte nos próximos meses!

E depois querem que me mantenha limpinha e hidratada... Entre baby, livro, entrevistas e tudo e tudo, vou perdendo litros de baba a torto e a direito...

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

[instantes] e, de repente... olha!



 
A Missão está ali, na mão direita de Jesus Cristo... Sou o bom ladrão, portanto. E, sim, confirma-se: ainda hoje tenho o paraíso. Está aqui a dormir ao meu lado. [No quarto ao lado, leia-se, exmos. colegas pediatras, que eu nem sou muito contra o co-sleeping, mas o baby gosta de dormir sozinho, graças a Deus! ]
(FNAC, Chiado)
Foto da minha amiga M.

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

[exercícios africanos] terceira lição

 
Exercícios africanos. Terceira lição: Na vida, o que importa não é para onde vamos, mas com quem viajamos! E está tudo dito...

[histórias de dentro de casa] a bisavó

Por estes dias fomos visitar a minha avó, uma senhora maravilhosa, com 99 anos e meio, lúcida como sempre esteve, quase independente... O pilar da família é uma mulher doce, a quem a viuvez e a morte recente de dois dos seis filhos ainda não conseguiu tirar o sorriso dos lábios e a esperança do olhar... Já vos falei dela quando vos revelei um segredo quase infalível contra a infertilidade (ou, pelo menos, é aquela história de sempre: com ela resultou!).

Eu queria muito contar-lhe do baby-de-mulata pessoalmente. Não queria que soubesse por outras pessoas nem por telefone. Toda a família me fez a vontade. Penso que desejava muito a aprovação dela... E surpreendeu-me! Como sempre... Quando lhe expliquei que o baby não era da minha barriga, mas que tinha sido adotado, a bisavó do meu menino respondeu, sem pestanejar:

- Filha, e isso que mais dá? Olha, não te preocupes, porque o que os filhos sentem é o amor que temos por eles. Isso é que é o mais importante...

Fiquei mesmo comovida... E tenho muita esperaça de que a vida para ele também seja simples e desta clareza.

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

[exercícios africanos] pronto, rendi-me...

Depois de ver o último post dos "exercícios africanos" que faço com o baby-de-mulata para ele se habituar a uma hipotética babá por terras de áfrica (e também para me poupar as costas e ele sentir o contacto quase pele com pele, mas isso é tão óbvio que escusava de o dizer), houve uma amiga que se compadeceu de mim e me levou a casa um presente maravilhoso! Eu não tenho um marsúpio porque não os acho muito giros (sim, eu sei, sou loira, pronto) e também porque não encontrei nenhum que desse para mais de 12 quilos, que é o que aqui o bacorinho pesa... E acho muito mais engraçada a capulana.

Mas ontem fui iniciada nas maravilhas do K'tan! (Eu nem acredito que me rendi em dois minutos! Quase me sinto uma traidora...)

O K'tan - neste caso não era bem um K'tan mas uma traquitana daqui - é realmente muito mais seguro, mais fácil, mais rápido, o bebé vem diretamente para a frente, não é necessário deixá-lo sozinho nas nossas costas, em perigo de cair (sim, que para além de loira sou um pouco accident-prone, não é segredo para ninguém), e faz as mesmas vezes, pronto... [Sniff, sniff...De qualquer forma, a prática da capulana já ninguém nos tira!]

Hoje ninguém olhou para mim como se eu fosse bicho curioso quando fui ao jardim com o baby... Enfim, rendi-me. Em Roma não sejas Moçambicano!



terça-feira, 13 de novembro de 2012

[exercícios africanos] how do i do it

 
 
A pedido de várias famílias, algumas já constituídas, outras em projeto, partilho convosco como é que eu faço os exercícios africanos com o baby-de-mulata para o preparar para uma ida a Moçambique. No vídeo podemos apreciar a D. Catarina, a parteira de Iapala, a colocar a neta na capulana.
(Iapala, Nampula)
Em voz-off, os comentários da minha amiga F.
 
Eu sei que faz impressão aquele momento em que a criança fica sem qualquer apoio nas costas dela mas, nesta técnica, não há mesmo outra maneira: as crianças têm de ficar muito quietinhas e a mãe não se pode mover para os lados, sob pena de a criança cair. Elas aprendem facilmente que não se podem mover. E também sentimos se a criança começar a resvalar, portanto conseguimos ampara-la. Mas enfim, eu, pessoalmente, como sou um pouco azelha e o baby não tinha prática destes assados, começámos por praticar em cima da cama e com alguém ao lado para amparar. A pouco e pouco fomos ganhando prática e agora já conseguimos levar a cabo todo o processo sem ajuda de mais ninguém (embora com alguém por ali para dar uma mãozinha se for preciso) e sem cama ou tapete por baixo!
 
E pronto, é isto. Não precisam de agradecer! Sabem que gostamos de fazer serviço público. E de ter as mãos livres...
 
Adenda: Esqueci-me de referir que o baby-de-mulata não gosta de ver o mundo a partir das minhas costas, portanto tenho de passar rapidamente por baixo do braço para que ele venha para a frente... E eu também gosto mais de o ter nessa posição de canguru.

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

[vozes brancas* #83] quando for grande quero ser pediatra!

Há já quase dois anos, na consulta de um menino de oito anos, perguntei-lhe que atividades extracurriculares fazia, ao que, muito prolixamente, me respondeu que tocava piano, andava no Inglês e nos Escuteiros, mas que estava a pensar desistir dos Escuteiros porque era tudo muito giro e rebeu-beu-beu-pardais-ao-ninho-que-de-lá-não-caem-sem-fazer-barulho-e-eu-estou-aqui-concentradíssimo-sócio mas que a catequese e a missa eram uma seca e ele não estava para aturar secas, que ouvir pessoas a falar de coisas que não interessavam ao menino Jesus era uma coisa que ele não estava disposto a fazer... O miúdo era giro, mas havia mais coisas para conversar. Interrompi, muito a custo, aquela verborreia para lhe perguntar (já a medo) o que gostaria de fazer quando crescesse...

- Quando for grande quero ser veterinário... Ou então pediatra, ainda não sei bem.
- Ah, que giro! São atividades com algumas semelhanças, sabes?
- Porquê?
- Porque nem os animais nem as crianças muito pequenas falam e temos de descobrir, por pequenos sinais, aquilo que eles têm.
- Ah, isso deve ser muito giro, deve ser como o trabalho de um detetive! Mas com as crianças deve ser mais giro...
- Isso mesmo, com as crianças muitas vezes temos grandes desafios - respondi, completamente derretida. - Mas vamos observar-te.

Enquanto o auscultava, via a garganta e os ouvidos, ele ia sempre perguntando, com imensa curiosidade e bastantes conhecimentos, para que servia cada coisa. Entretanto pediu-me para experimentar o esteto e claro que o deixei (eu sou uma fácil, já se sabe...). No fim, quando estava a ver-lhe os ouvidos tentou convencer-me a que o deixasse também experimentar aquele aparelho fascinante. Hesitei, mas perante aquele "futuro colega" brilhante, respirei fundo (detesto que me vejam os ouvidos!) e pus-me a jeito. Ele espreitou e declarou, solenemente:

- Ai, que nojo!

Ups... Tempos depois voltei a consultar o menino. Queria ser futebolista...

* Timbre da voz das crianças antes da puberdade.

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

[sentido de oportunidade] obama em angola!

 
Em tempos tivemos um post com uma imagem de um salão de cabeleireiro em Moçambique que anunciava, precisamente, que a cliente entrava feia (pronto, isso era ponto assente, a realidade não deve ofender ninguém), mas sairia garantidamente bonita! Mas esta barbearia em Luanda supera absolutamente tudo! No sentido de oportunidade, no marketing, na variedade de oferta (quem, no seu perfeito juízo, perderia uma oportunidade para carregar um telemóvel enquanto faz "barba e cabelo"?), na ortografia, na caligrafia e no sentido estético.
(G'amei do facebook, Luanda)

[vozes brancas* #82] a roda dos alimentos

Há tempos, voltei a ver em consulta de rotina uma menina, agora já com quatro anos, com uma história pesadíssima de doença cardíaca congénita, operada múltiplas vezes nos primeiros meses de vida. Neste momento é uma princesa bem disposta, cheia de energia e graça, uma menina que dá mesmo gosto rever! Nesta consulta, para além de ter tratado dos problemas de saúde que continua a ter, falei com ela sobre estilos de vida saudável, a roda dos alimentos, higiene, o comportamento na escola, que não anda a ser dos melhores... Disse-me que adorava o ballet e a ginástica e que gostava muito de andar de bicicleta.

- Ai, que linda! Muito bem, esse exercício todo faz-te muito bem ao coração e ficas ainda mais bonita!
- Tia, P…
- Sim, princesa?
- Os chocolates e as batatas f'itas fazem mal ao co'ação?
- Sim, linda, fazem muito mal. E é por isso que nem sequer fazem parte da roda dos alimentos. Vê lá se encontras chocolate e batatas fritas aqui na roda dos alimentos.
- Ah… Não, não estão aqui. Mas estão aqui batatas…
- Sim, mas cozidas. As coisas fritas não fazem parte da roda dos alimentos.
- E as gomas?
- Gomas também não estão aqui, fazem mal ao coração e muito mal aos dentes!
- Ah, e roer as unhas também faz mal aos dentes?
- Sim, querida, e pior, as unhas são a parte mais suja do nosso corpo. Têm muitos, muitos micróbios que fazem mal à barriga.
- Mas depois vêm os “blogues” brancos e matam os mic’óbios todos!
- Sim, mas a barriga ainda dói durante muito tempo até os glóbulos brancos os matarem todos. Às vezes não te dói a barriga? [A quem não dói a barriga de vez em quando?]
- Sim, dói muitas vezes… Os “blogues” são lentos?
- Sim, demoram muitos dias, às vezes, até conseguirem comer os micróbios todos.

Continuei a falar com a mãe enquanto a menina, aparentemente alheada da conversa, fazia um desenho na mesa de atividades. De repente:

- Mãe, olha!
- Sim, linda?
- Hoje à noite vou fazer uma sobremesa muito especial!
- Então? O que vai ser?
- Batatas f'itas COZIDAAAS!

* Timbre da voz das crianças antes da puberdade.

segunda-feira, 5 de novembro de 2012

[gémeos] um só par é para meninos!

De vez em quando não resisto a voltar a este assunto... Tenho uma amiga que foi enfermeira durante a vida toda no Hospital Pediátrico de Coimbra. A Eugénia é uma mulher de armas que parece pelo menos 20 ou 30 anos mais nova do que a idade que tem! Competente, bem-humorada, cheia de energia. (Ela não lê este blogue, não lhe estou a fazer nenhum elogio gratuito!) Há alguns anos, depois de reformada, resolveu partir para Moçambique para ajudar na missão do Marrere, uma localidade próxima de Nampula, a capital do Norte.

O Marrere tem um dos melhores hospitais da região (em termos humanos e organizacionais) e é lá que passa os dias, apoiando os mais doentes de todos: as crianças desnutridas e os doentes com VIH, sobretudo as grávidas e as crianças suas filhas. Há tempos enviou-nos esta foto e a seguinte explicação:


 
O senhor Lino Mesa e a Dona Arlinda Botão foram pais pela décima nona vez, dando deste modo um enorme contributo para a taxa de natalidade da província, para além de serem um caso raro de extrema fertilidade! Das doze gestações nasceram dezanove filhos – cinco gravidezes gemelares, uma gravidez de trigémeos e as restantes de apenas um filho ou seja metade das gravidezes foram gemelares*. É obra! Esta última gravidez gemelar foi seguida aqui na consulta de grávidas.

 Apenas catorze dos filhos estão vivos... Os bebés João e Joana frequentam o centro de nutrição e são apoiados com leite adaptado, roupa, biberões e fraldas. Os irmãos Orlando e Orlanda**, que frequentaram no ano de 2009 a nossa consulta, estão de boa saúde. São um casal muito unido e bem-disposto e o papá Lino acompanha sempre a esposa à consulta dos seus filhos. 

* Este post é dedicado à Ana F. e à Sílvia, as minhas amigas que atualmente estão à espera de gémeos, e também à Ana D., cujos filhos fazem cinco anos!
**Já vos falei das peculiaridades dos nomes dos gémeos em Moçambique, se não se lembram podem ir rever...

domingo, 4 de novembro de 2012

[socorro! tenho uma mãe beata!] histórias do baby-de-mulata

O baby-de-mulata e baby M., seu primo pseudo-gémeo, andam nas aulas de música para bebés desde que a escola de música abriu em Setembro. As aulas são muito dinâmicas e divertidas e assim sempre se apazigua o trauma da sua mãezinha, que já contava 17 primaveras bem passadas no dia em que, por milagre, um professor de canto que não a conhecia de lado nenhum, na primeira aula lhe colocou a voz em 5 minutos! (Rezei por ele durante anos, que o que aquele homem fez pela minha autoestima, nem uma estátua com o meu busto no Marquês de Pombal! E, portanto, ó gentes vos juro, no meu saber de experiência feito: "no peito dos desafinados também bate um coração", é certo, mas estamos sempre a tempo de afinar!)

Nas aulas de música para bebés, depois de um acolhimento e do "Bom Dia", descalçam-se os meninos, e a aula inicia-se com pais e filhos de joelhos, mãos para cima e um "pá-pá-rá-rá-pááááá... pum!", num exercício de tónicas e dominantes algo espalhafatoso para lhes captar a atenção e fazê-los rir!

Ora, no outro dia, na missa, o baby brincava no chão enquanto sua mamãe cantava no coro, quando ele se deu conta de que se tinha feito silêncio e as pessoas estavam ajoelhadas. Largou os carrinhos, ajoelhou-se também e, em posição, vá de "pá-pá-rá-rá-pááááá... pum!"

E enquanto os meus amigos sorriam e desviavam o olhar para não se rirem, eu mandava-o calar, babando discretamente. Sim, que o menino podia ainda não ter captado a mística da religião, mas tinha apanhado a tónica e a dominante da música que tínhamos acabado de cantar! Cada um é para o que nasce, já sabemos...

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

[zambézia versus paris versus new york] criaturas lendárias...

 
Nova Iorque tem o King Kong, Paris o Quasimodo, mas...
a Zambézia é exótica!
 
Este é um repost sobre o mito de origem dos macuas, o povo que habita algumas províncias do norte de Moçambique... Sobre o guardião do monte Namúli, vale a pena ler a explicação do Vítor, correspondente honoris causa deste mato, atualmente residente na Dinamarca, mas que viveu na Alta Zambézia durante anos...

Perto de Guruè, na Zambézia, fica o Monte Namúli, que é a segunda montanha mais alta de Moçambique e é, para as pessoas da região, os macuas-lómuès, o berço da Humanidade. Dizem que lá se podem ver as pegadas do primeiro homem. Mas não se devia poder. Quer dizer, ninguém devia poder vê-las. Parece que as coisas mudaram um bocado desde que eu vivi naquela província, e vi guias de viagens recentes que aconselham caminhadas no Monte Namúli. Antigamente só se podia escalar a montanha até um determinado sítio. A partir daí, era proibido, porque era terra sagrada. O castigo de quem se aventurasse até à parte de cima do monte era (como é muitas vezes, nesta parte do mundo, o castigo de quem viola alguma regra costumária) a pessoa perder-se e nunca mais encontrar o caminho para casa. 
O que é original – e delicioso, na minha opinião – na lenda macua é a maneira como a pessoa se perde: se o guardião eterno da montanha lá apanhar alguém, começa a falar com essa pessoa tanto e tão depressa que a confunde completamente; e ela, de tão baralhada que fica, nunca mais encontra o caminho de volta.