Ontem desci as escadas com o coração pequenino, pequenino. Voltei para a animação carnavalesca do serviço de urgência com uma perturbação quase física no peito. Tinha ido dar uma notícia ao pai de um menino que estava internado há quinze dias num quarto de isolamento com uma doença grave.
Coloquei uma máscara para poder ir à porta e por isso ele não me viu sorrir, mas percebeu pelo meu olhar que a hora tinha chegado. E ele estava à espera. Já estava à espera daquele momento há mais de quinze dias. Sabia de todas as hipóteses, estava a par das nossas dúvidas, das nossas preocupações, dos nossos avanços e recuos. Sabia que o menino estava na mesma há muito tempo. Tempo demais, no seu coração de pai. Tanto tempo que já tinha deixado de fazer perguntas. Talvez por isso eu tenha tido de repetir três vezes a mesma frase até ele a compreender: "É benigno!" Eu também. Também só à terceira vez é que entendi o tamanho da angústia que lhe tinha abafado as perguntas e amordaçado a esperança...
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