quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

[vozes brancas*] desfazer o presépio...



E para terminar com um sorriso esta quadra de Natal, no dia em que conto desfazer o presépio (três andares de figuras de barro resistiram, miraculosamente intactos, ao fervor exploratório do baby-de-mulata e de Baby M.!), conto-vos novamente a história de um menino com três anos e meio que veio à minha consulta muito zangado por estar ali, tentando a custo esconder-se encolhido atrás da sua mãe, desgraçadamente uma mulher elegante e estreita, sem umas ancas que lhe pudessem servir de escudo contra aquele ser ameaçador de bata branca que muito a despropósito lhe sorria. O que ele não teria dado para que a mãe usasse uma saia larga que lhe servisse confortavelmente de teto de abrigo... A consulta decorria:

- E então, ele agora já fala melhor? Da última vez ainda tinha dificuldade na articulação dos sons sibilantes.
- Ui, se fala, Doutora, bem demais!
- Então?
- Ai, nem queira saber, no outro dia foi a babá que o foi buscar ao colégio e passou uma vergonha no autocarro!
- Pois... ainda não há muita crítica nesta idade... Mas o que foi que aconteceu?
- Bem, eles iam a passar pela embaixada da Índia e entrou um senhor com um turbante enorme, com uns brilhantes e uma roupa assim muito colorida e ele ficou entusiasmadíssimo a apontar para ele e a dizer muito alto: "Carla, está ali um rei!" e ela: "Sim, sim, querido, chiu, mais baixo." e tentou distraí-lo, mas ele continuava cada vez mais alto porque ela não lhe ligava: "Carla, olha, olha para ali, está ali um rei!"
- Ahaha, lindo...
- Ela já nem sabia onde é que se havia de meter, porque estava toda a gente a olhar e a rir e o senhor muito encavacado... E ela: "Sim, querido, já vi. E o que é que fizeste hoje na escola?" E ele já completamente em euforia: "Carla, mas tu não estás a olhar! Está ali um rei! Eles foram levar presentes ao menino Jesus! É o Belchior!"

* Timbre da voz de uma criança antes da puberdade.

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