sábado, 21 de julho de 2012

[outras palavras] imposto de pele...



Mercado em Maputo.
(Xipamanine, Maputo)


Artigo escrito pelo Manuel Cardoso, sj, que vive na Beira (Moçambique) há quase um ano. Daqui.


Sou branco, "muzungu" – em língua Sena. Em Portugal já me chamaram copinho de leite, branquela, desmaiado, e tantas outras coisas! A verdade é que a melanina da minha pele não me permite passar um dia inteiro na praia. Pronto, está dito!

Ora, um muzungu em Moçambique tem a vida mesmo acrescentada! Eu chamo-lhe Imposto de Pele: se a banana custa “10-10” (lê-se «dez dez», e significa que um cacho custa 10 meticais, e cada outro cacho outros 10 mt), para um muzungu custa 20-20! Se o tomate custa 15mt a latinha (uma lata de feijões serve de medida: os que cabem dentro constituem a quantidade a adquirir), para muzungo custa 30 mt! Se a alface custa 10-10, para muzungu pode custar 30-30!

O preconceito é: muzungu tem dinheiro! Muzungu é imediatamente chamado de «boss», mas esta subserviência aparente engana: o muzungu desprevenido acaba por pagar muito caro os produtos que compra (caro quando comparado com os preços locais... ).
Como lidar com isto? Há muzungus que não se importam nada: uns porque gostam de ser tratados como reizinhos, gente superior, e ter povo que os bajule e que eles podem tratar mal sem terem consequências nenhumas; outros muzungus não se importam de ser aldrabados nos preços, porque vêem a miséria das pessoas que vendem nas ruas e nos bazares. Para este segundo grupo de muzungus, deixar-se enganar é uma forma de ajudar a família daquele vendedor a passar melhor o dia de hoje, e “a diferença de preços também não é assim tão grande para quem tem bons ordenados” – argumentam eles. Há ainda um terceiro grupo, o meu, o grupo dos muzungus que odeiam ser roubados, aldrabados, enganados e extorquidos, mesmo que por necessidade! Se me pedem ajuda é uma coisa, roubar-me é outra! Percebo as carências que muitas famílias passam, aliás muitos dos meus vizinhos vivem com grandes dificuldades, mas tirarem-me dinheiro à má-fé custa-me horrores!

É importante explicar que esta não é uma questão racial, não se trata de racismo: com africanos bem vestidos, ou que conduzam bons carros, a compra também é acrescentada! Aí não pode chamar-se Imposto de Pele, mas é qualquer coisa como uma Taxa Adicional sobre os Altos Rendimentos… O Imposto de Pele apenas se aplica ao muzungu, mas esse, mesmo que esteja vestido de pedinte, ninguém acredita que não tenha dinheiro! Há dias, contava-me uma mamã moçambicana: “Ouvi dizer que na África do Sul já há mendigos brancos, mas não acredito nisso…”
Continua...

1 comentário:

  1. Esta mulungo (no sul é mulungo), confirma tudinho e até costuma dizer : "ishhhhhhh amigo, sou branca, mas não banca!"...
    Em Maputo a disparidade de preços pode raiar o absurdo (o que não importava muito para muita gente quando o euro estava alto, agora já não é bem assim...)e aqui eu aprendi a regatear desde sempre, aliás não fazê-lo chega a ser uma afronta ao vendedor...

    Beijos grandes da cidade das acácias.

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