terça-feira, 31 de julho de 2012

[arina] acreditar no milagre


Continuam a chegar ao nosso hospital pessoas que acreditam. Pessoas que ouviram o apelo e vão oferecer um pouco de si próprias e palavras de amizade à nossa menina.
Bem-hajam!

[as melhores do serviço de urgência] acreditar no milagre

Há dias, estava eu no Serviço de Urgência, quando o segurança entrou no meu gabinete e me disse que tinha uma senhora na sala de espera há já algum tempo à procura de uma tal de doutora Paula.
- Dra. Paula? Hoje não vem nenhuma das doutoras Paulas do hospital.
E a colega que estava comigo:
- Mas diga à senhora que dê o recado, que pode ser que a consigamos ajudar.
 Dois minutos depois, o segurança veio dizer-nos: "A senhora diz que a menina é Iara."
- Como? Mas ela não disse mais nada? Veio para consulta, para exames, para ser vista?
- Não sei, e pelo menos que eu tenha visto, não tem nenhuma criança com ela.
- Então diga-lhe para entrar, que não estamos a perceber nada.
Entra a senhora:
- Diga, podemos ajudá-la?
- Estou à procura da Dra. Paula... não me lembro do apelido.
- Mas combinou com ela?
- Não, mas ela disse que podíamos vir até às 13:00.
- Hoje?
- Qualquer dia. Pelo menos foi o que eu percebi.
- Ah, e o que tem a sua menina?
- Eu só sei que a menina se chama Iara ou Lara, não sei...
- Mas quem é essa menina?
- Também não sei, não a conheço...
Nisto, tive um rasgo...
- É a Arina?
- Sim, é isso!
- E vem doar medula óssea para ela?
- Sim, estavam a pedir pessoas de Cabo Verde!
- Ah, que maravilha, muito obrigada! Venha comigo, é no Serviço de Sangue!

A mensagem passou, felizmente! E continua a passar... Pessoas que ouviram a reportagem na rádio e na televisão, pessoas que não ouviram, mas que ouviram falar, pessoas que só ouviram metade da mensagem mas perceberam que era preciso vir ajudar alguém... pessoas que viram no facebook, ou que ouviram dizer que alguém escreveu no facebook: muito obrigada a todos!

[zambézia] o meu hospital no gilé #7


A enfermaria de Pediatria, alguns dos meninos das últimas camas, as redes mosquiteiras fechadas, os soros na janela. Os meninos já vistos sairam. Foram tomar banho ao rio e mata-bichar.
(Gilé, Zambézia)

[zambézia] o meu hospital no gilé #6


As mamãs da cama 12 e o soro pendurado na janela...
(Gilé, Zambézia)

segunda-feira, 30 de julho de 2012

[zambézia] o meu hospital no gilé #5


Os meus meninos...
(Gilé, Zambézia)

sábado, 28 de julho de 2012

[baby m.] parabéns, meu amor!

Faz hoje um ano que o teu choro de alvoradas me encheu de alegria, depois daquela angústia na sala de partos. Faz hoje um ano que a família se tornou muito mais rica, com uma felicidade a toda a prova. A nossa riqueza é o teu sorriso... Obrigada, meu amor!

[zambézia] o meu hospital do gilé #4



Milena e sua mãe na enfermaria de Pediatria...
(Gilé, Zambézia)

sexta-feira, 27 de julho de 2012

[zambézia] o meu hospital no gilé #3


Mais uma imagem da enfermaria de Pediatria. Dois doentes e respectivas mães na mesma cama...
(Gilé, Zambézia)

quinta-feira, 26 de julho de 2012

[olavula emakhwua*] viver a dois


Ekarawa emosa khenruma!
Provérbio macua com que os casais felizes explicam aos mais novos que a vida a dois é mais rica: "Uma pulseira sozinha não faz barulho."
(Gilé, Zambézia)


* Falar macua.

[zambézia] o meu hospital no gilé #2



Um outro aspecto da enfermaria de Pediatria.
(Gilé, Zambézia)

quarta-feira, 25 de julho de 2012

[welcome to mozambique] a enfermaria de pediatria do hospital


A enfermaria de Pediatria do Hospital do Gilé...
(Gilé, Zambézia)

terça-feira, 24 de julho de 2012

[zambézia] momentos




 Numa comunidade próxima da sede do distrito...
(Gilé, Zambézia)

[zambézia] epidemia de cólera





Era aqui que eu queria estar... Palavra que às vezes tenho vontade de largar tudo, deixar os relatórios e a conversa de chacha e ir trabalhar para onde é preciso. Em Portugal estamos na silly season. Fala-se do tempo, da praia, dos 10 minutos mais engraçados da história de Portugal na actualidade (o tempo em que o Relvas esteve na Lusófona) e de outros não-assuntos.

No Gilé, infelizmente, não estamos na silly season. Na Zambézia estão a braços com um surto de cólera apocalíptico. Todos os dias tenho notícias da morte de pessoas que conheci, que vi, que tratei em tempos... As autoridades, como sempre, escondem a verdadeira dimensão da epidemia. Os jornais, há três dias, falavam em 13 óbitos. Ora entre as pessoas que eu conhecia já se contam mais de vinte... E estão, infelizmente, longe de ser todos. (É sempre assim, enquanto não atingirem o estado de catástrofe, mais vale esconder os números. Quando chegarem ao número de óbitos que lhes permite lançar uma campanha de solidariedade internacional é que revelam tudo...)

Rezo por eles porque, desgraçadamente, não posso fazer mais nada... pelas Irmãs e pelas nossas meninas e que a epidemia não dure mais tempo. Pelo menos desta vez não há falta de meios de tratamento, é o que me dizem. Estão duas equipas de Maputo e de Quelimane no terreno, mas as pessoas continuam sem confiar na Medicina e chegam tarde ao hospital... Quando é que isto terá um fim? Ai... como diria umBhalane: AINDA...
(Gilé, Zambézia)

domingo, 22 de julho de 2012

[outras palavras] imposto de pele


Mercado...
(Nampula, Moçambique)

Continuando...

Estas pequenas aventuras do dia-a-dia acontecem porque a vida de grandes camadas da população se faz com enormes dificuldades económicas. Fazer apenas uma refeição por dia é bastante habitual nas pessoas da minha paróquia – situada numa zona residencial da Beira, segunda cidade de Moçambique. Acho que esta atitude tem uma justificação mais socioeconómica que racial, ou cultural. Ou seja, não acho que me roubam por racismo, nem porque na cultura local isso não seja moralmente tão grave como o é na minha cultura, mas acho que me roubam porque precisam e porque a necessidade embebeu a cultura tornando-a mais tolerante quanto ao roubo, e que isso se fixou numa altura em que os muzungus eram os únicos com educação superior à 4ª classe e, portanto, eram os que detinham o capital e os meios de produção, como diria Marx…

Finalmente, pergunto-me: como construir uma sociedade justa com a barriga vazia? Como não roubar o muzungu se esses parcos meticais fazem uma enorme diferença na alimentação dos seus filhos? Alargando a crónica do negócio entre particulares, para a relação do cidadão com o Estado, pergunto-me: como posso convencer alguém com fome a preservar o espaço público (o caixote do lixo, o banco para esperar os machibombos (autocarros) ou a areia da praia)? Qualquer uma destas coisas dá a uma família de classe baixa materiais para não ter chuva em casa, ou rendimento para dar de comer aos filhos.

 Acredito que construir um Moçambique mais justo, onde não se roube nem muzungu nem rico, terá que passar por uma alteração social de monta, só numa sociedade onde a sobrevivência esteja garantida se pode pensar em construir um Estado.

Moçambique está a começar a explorar grandes quantidades de petróleo, carvão mineral, fosfatos, gás natural, madeiras e recursos piscícolas. Esperemos que essa riqueza, que constitucionalmente pertence ao povo, possa originar a melhoria real das condições de vida das populações. O cenário actual, tanto em Moçambique como por essa África fora, é desanimador e aconselha prudência na futurologia, pois por todo o lado as diferenças sociais se agudizam em vez de diminuir, mas pode ser que desta vez…

sábado, 21 de julho de 2012

[outras imagens] a missa mais linda...


Repost, repost, repost... De vez em quando tenho de voltar aqui, à cidade da Beira, pelos olhos e ouvidos do Francisco Campos, sj... É linda esta música, é arrebatadora esta alegria!

[outras palavras] imposto de pele...



Mercado em Maputo.
(Xipamanine, Maputo)


Artigo escrito pelo Manuel Cardoso, sj, que vive na Beira (Moçambique) há quase um ano. Daqui.


Sou branco, "muzungu" – em língua Sena. Em Portugal já me chamaram copinho de leite, branquela, desmaiado, e tantas outras coisas! A verdade é que a melanina da minha pele não me permite passar um dia inteiro na praia. Pronto, está dito!

Ora, um muzungu em Moçambique tem a vida mesmo acrescentada! Eu chamo-lhe Imposto de Pele: se a banana custa “10-10” (lê-se «dez dez», e significa que um cacho custa 10 meticais, e cada outro cacho outros 10 mt), para um muzungu custa 20-20! Se o tomate custa 15mt a latinha (uma lata de feijões serve de medida: os que cabem dentro constituem a quantidade a adquirir), para muzungo custa 30 mt! Se a alface custa 10-10, para muzungu pode custar 30-30!

O preconceito é: muzungu tem dinheiro! Muzungu é imediatamente chamado de «boss», mas esta subserviência aparente engana: o muzungu desprevenido acaba por pagar muito caro os produtos que compra (caro quando comparado com os preços locais... ).
Como lidar com isto? Há muzungus que não se importam nada: uns porque gostam de ser tratados como reizinhos, gente superior, e ter povo que os bajule e que eles podem tratar mal sem terem consequências nenhumas; outros muzungus não se importam de ser aldrabados nos preços, porque vêem a miséria das pessoas que vendem nas ruas e nos bazares. Para este segundo grupo de muzungus, deixar-se enganar é uma forma de ajudar a família daquele vendedor a passar melhor o dia de hoje, e “a diferença de preços também não é assim tão grande para quem tem bons ordenados” – argumentam eles. Há ainda um terceiro grupo, o meu, o grupo dos muzungus que odeiam ser roubados, aldrabados, enganados e extorquidos, mesmo que por necessidade! Se me pedem ajuda é uma coisa, roubar-me é outra! Percebo as carências que muitas famílias passam, aliás muitos dos meus vizinhos vivem com grandes dificuldades, mas tirarem-me dinheiro à má-fé custa-me horrores!

É importante explicar que esta não é uma questão racial, não se trata de racismo: com africanos bem vestidos, ou que conduzam bons carros, a compra também é acrescentada! Aí não pode chamar-se Imposto de Pele, mas é qualquer coisa como uma Taxa Adicional sobre os Altos Rendimentos… O Imposto de Pele apenas se aplica ao muzungu, mas esse, mesmo que esteja vestido de pedinte, ninguém acredita que não tenha dinheiro! Há dias, contava-me uma mamã moçambicana: “Ouvi dizer que na África do Sul já há mendigos brancos, mas não acredito nisso…”
Continua...

sexta-feira, 20 de julho de 2012

[welcome to mozambique] a força que um olhar lindo pode ter!


Menina...
(Ilha de Moçambique, Moçambique)

quinta-feira, 19 de julho de 2012

[welcome to mozambique] amor de mãe


Perto da casa das Irmãs, uma mamã com um filho albino... Os olhos tristes de quem tem um filho deficiente, impuro, que denuncia a léguas de distância um pecado sem perdão cometido contra os antepassados. Um filho que, como é do conhecimento geral, não pertence à família, não terá futuro e poderá desaparecer a qualquer momento, certamente raptado para a prática de feitiçaria, mas que todos dirão apenas, sem qualquer surpresa, que desapareceu desvanecido no ar... Ninguém se preocupará em desvendar o não-mistério, o desaparecimento mais do que previsível de um menino condenado... Sim, porque toda a gente sabe que os albinos não morrem: desaparecem. Já vos tinha dito, lembram-se?

 Esta mamã ama o seu filho. Como não? É um menino lindo! Mas ama-o com o sentimento amargo, doloroso e desesperado dos que sabem que esse amor tem data marcada.
(Gilé, Zambézia)

quarta-feira, 18 de julho de 2012

[welcome to mozambique] a montanha do sol nascente


O dia começa devagar no Gilé, e a sombra ensonada da montanha deixa ainda umas gotas de bruma e penumbra, prolongando a frescura misericordiosa da noite até que o sol rompe, tardio mas contundente, tornando a terra num brasido...
(Gilé, Zambézia)

terça-feira, 17 de julho de 2012

[instantes] porque a vida é todos os dias...


Criança com irmão mais novo no pátio da escola...
(Gilé, Zambézia)


- Onde está a tua mãe, menina?
- Mamã está na escola.
- E o que fazes aqui? Já são 18 horas.
- Tomo conta do meu irmão pequeno. Quando ele chora vou à sala de aula para mamã lhe dar de mamar.
- A que horas vais para casa?
- Às 21, quando a mãe sai da escola...

Às vezes nem sei o que pensar disto, meus amigos... Criam-se laços fortes entre irmãos, é certo, fortalece-se o sentido de família, mas mas acho que por pior que sejam as condições de vida, não é justo que sejam as crianças a cuidar dos irmãos mais novos durante o tempo em que as mães estão na escola. Sobretudo porque, mais uma vez, são as meninas as sacrificadas. São as meninas que se resignam à sua condição de mulheres para ajudar as mães. E acabam por crescer a considerar normais todas estas provações. Horas seguidas em pé, sem comer, expostas ao frio e aos mosquitos quando já deveriam estar a brincar, a fazer os deveres ou a dormir...

A sério que não me parece assim tão complicado erguer um pequeno abrigo e ter duas senhoras mais velhas a cuidar das crianças todas. Criavam-se dois postos de trabalho, valorizavam-se as mulheres idosas (tão discriminadas no país todo) e os dias tornavam-se menos duros para as crianças... Porque eu sei que tem de haver um caminho! E rai's me partam se não o vou trilhar!

domingo, 15 de julho de 2012

[acreditar no milagre] em nome da arina, obrigada!




A iniciativa do dia 11 na Lusófona foi um sucesso! Muito obrigada a todos os que participaram e que por isso poderão vir a tornar-se nos salvadores da nossa menina. E um sorriso muito especial a todos os que nos ajudaram a divulgar esta iniciativa, em especial à Cocó na Fralda, Às Nove no meu Blogue, Paracuca, Kitty Fane, Ana Leão (ma-schamba), e a todos os que publicamente ou de forma particular contribuiram para que o dia fosse marcado no calendário de tanta gente...

Ainda estão a tempo. Aliás, sempre a tempo! No Hospital Dona Estefânia todos os dias úteis das 09:00 às 13:00 e no Hospital Pulido Valente no mesmo horário.

Bem-hajam. A nossa menina e a sua mãe continuam a lutar!

sábado, 14 de julho de 2012

[vozes brancas* #73] os bebés da barriga





Anteontem estive com os amigos de um casal que adoptou um rapaz que agora tem seis anos e uma menina que agora tem quatro. Quando a mais nova foi entregue à família, com 18 meses de vida, o irmão já tinha quase quatro anos e lembra-se de ir com os pais buscá-la. As explicações e as perguntas que fez aos pais, na altura fizeram-lhe sentido suficiente. Não voltara a pôr mais questões sobre o assunto.

Há tempos, souberam que iam ter um primo. A irmã da mãe tinha um bebé na barriga, que crescia a olhos vistos, dava pontapés e deslumbrava a menina mais nova, num misto de surpresa desconcertada e fantasia com um Nenuco de verdade. Dias depois da notícia, os pais ouviram uma conversa entre os filhos:

- E nós? Também viemos da barriga da mãe? - perguntava a mais nova.
- Não, tás parva? - respondia o irmão - Nós viemos de taxi!

* Timbre da voz de uma criança antes da puberdade.

terça-feira, 10 de julho de 2012

[amanhã] SNS we can!


Trocado por miúdos: Greve. Pela continuação do Serviço Nacional de Saúde! Façam greve por mim, por obséquio, que eu não posso, que estou de urgência.

segunda-feira, 9 de julho de 2012

[nomes que dizem tudo #29] cr7

Esclarecimento público à Maria Bê e restante comunidade azul-bolacha, a propósito do nome do pequeno biscoito, que, rezemos, se manterá no forno em lume brando, a 37ºC à sombra, por muitas e boas semanas até ao fim dos tempos. Ou pelo menos até às 34 semanas, que mais não se pode pedir:

Minha querida, estamos na silly season mas eu tenho andado alerta. Desde o final do Euro 2012 que ainda não nasceu nenhum Cristiano em Lisboa. De facto, procurando bem, este ano só ainda nasceram dois Cristianos. E então Cristianos Ronaldos não nasce nenhum desde 2008! Não sei o que se passa, minha gente... Estaremos a ficar amargos? Pessimistas? Deixámos de ter fé no nosso futebol e no melhor do mundo? O que será que nos resta?

Há, porém, uma Ronalda, colheita de 2010, que salva a honra do convento! Eu acho que ainda há esperança.

domingo, 8 de julho de 2012

[outras palavras] a greve dos dias 11 e 12


Infelizmente não poderei fazer greve no dia 11 porque estarei de urgência e a 12 estarei de saída de banco, pelo que a minha ausência não vai contar para os números da greve. Mas eu e a minha equipa vamos trabalhar como normalmente fazemos durante um domingo ou um feriado: assumiremos a responsabilidade de todos os meninos graves internados no hospital e haveremos de observar todas as crianças que acorrerem ao serviço de urgência. Para nós vai ser trabalho a duplicar. E oxalá o seja.

Nunca poderei escrever como a Dra. Muxy (Paracuca) sobre este assunto, por isso transcrevo aqui as palavras dela:

«O senhor ministro diz, demasiadas vezes, que as propostas que põe sobre a mesa vão de encontro às reivindicações dos médicos, diz que o que o preocupa são os utentes que vão ficar sem consultas por causa das greves, diz ainda que a requisição civil está sempre sobre a mesa e diz também que não tem medo dos médicos. A comunicação é difícil, eu sei, mas vivia na ilusão que falávamos a mesma língua.
O que os médicos reivindicam é o fim do contrato de horas em massa. Se as horas que estão a concurso equivalem ao trabalho de 1800 profissionais a tempo integral de 40 horas então queremos contratos e não horas avulso. O que o senhor põe na mesa é um tecto mínimo para o preço dessas horas. Não vai de encontro ao que queremos, desculpe lá. O senhor não sabe mas eu conto-lhe porque sou generosa: a medicina de qualidade depende de uma política de serviço, de uma hierarquia, de um pensar conjunto, da discussão dos doentes, de assumir os doentes como nossos e ter com eles uma relação perene. O trabalho à hora não garante nada disto.
O senhor diz que está preocupado com os doentes e nós sabemos que na comunicação social vai aparecer a senhora que fez quilómetros para ir a uma consulta que o estupor do médico não fez. Descanse excelência, as consultas vão ser feitas, noutros dias pelos mesmos médicos. Fazer greve não nos poupa trabalho, a nossa relação com os doentes é fiel e por isso fazemos questão de sermos nós a ver os nossos doentes em vez de médicos estranhos contratados à hora.
Ameaça-nos com a requisição civil. Não receamos, excelência! O direito à greve é nosso pela constituição, sabemos quais são os serviços que não podem falhar e vamos cumpri-los. Não precisamos de castigos, somos cidadãos responsáveis.
Não tem medo da greve mas perde tempo a desprestigiar a classe. Que somos pouco razoáveis, que não estamos abertos à negociação, que a ordem é amiga mas os sindicatos são maus. Tenha paciência e seja decente.
Defendemos o direito ao trabalho não precário, defendemos a justiça salarial e defendemos acima de tudo o Serviço Nacional de Saúde. Aquele que vocês, os senhores da austeridade expansionista (piada, piada) acham que é demasiado caro e, arrisco, demasiado bom para os portugueses.»

sábado, 7 de julho de 2012

[welcome to mozambique] produtividade, uma definição


A manhã já vai alta em Marromeu, e dois homens enfrentam a loucura do dia-a-dia.
Bom fim de semana!
(Marromeu, Sofala)
Instante captado pelos donos do Portal de Sena

[arina] a nossa estrela radiofónica

Arina, a nossa menina querida, internada connosco há mais de seis meses com uma aplasia medular, tornou-se estrela radiofónica da RDP África! A minha colega Paula K., as enfermeiras Liliana e Sara que dinamizaram esta iniciativa e a mãe da Arina falaram muito bem e deram mais vida a esta esperança.

Parabéns, minhas queridas!

Não esqueçam, no dia 11 de Julho na Universidade Lusófona haverá uma brigada para colheita de sangue a dadores voluntários de medula óssea. E não, não vou cair na piadola fácil de que enquanto esperam podem aproveitar para tomar um café ou tirar um pós-doutoramento...

quinta-feira, 5 de julho de 2012

[instantes] olhares anónimos





Olhares cheios de presente e de futuro. Paisagens cheias de passado.
(Ilha de Moçambique, Nampula)
Fotos de autores de desconhecidos.

quarta-feira, 4 de julho de 2012

[acreditar no milagre] coragem, mãe coragem!

Já vos falei da nossa princesa, a Arina, a menina Cabo-Verdiana de quatro anos que está internada desde Outubro no nosso hospital. Que mais vos posso contar sobre ela?

 A mãe, ainda jovem, era educadora de infância em São Nicolau. O pai, igualmente jovem é fotógrafo e continua em Cabo Verde com o filho mais velho, a trabalhar para o poder sustentar e ainda ajudar um pouco a mulher e a filha em Lisboa. A filha adoeceu em Agosto do ano passado, e perceberam rapidamente que algo de muito grave se passava com ela. Cheia de nódoas negras, com pouca energia para brincar... Os médicos não lhes deram esperança nenhuma em Cabo Verde. Se ficasse não conseguiria sobreviver. Tinha de ser transferida para Lisboa. Era a única esperança.

E a mãe continua agarrada a essa esperança. Eu pessoalmente não sei o que faria nessas circunstâncias. Sabendo que a probabilidade de a minha filha sobreviver era assim tão escassa, o mais provável seria que a mimasse até à exaustão. Que lhe fizesse as vontades todas. Que fizesse questão de gozar o mais intensamente possível o tempo que passava com ela. Todos os dias. E que chorasse, que desesperasse, que vivesse naquele eterno dilema: se lhe imponho limites e castigos, depois posso arrepender-me de ter sido demasiado severa, se não lhe imponho limites, corro o risco de não a preparar para viver no mundo real.

Não é o que esta mãe faz! Não há uma hesitação. Todos os dias nos olha com um sorriso. Todos os dias inventa jogos didácticos para a filha, ensina-lhe as letras e os números, faz desenhos, puxa por ela. Desde o início do internamento que a nossa princesa já aprendeu poemas e canções, largou as fraldas à noite, fala Português tão bem como Crioulo sem se enganar em que língua se deve dirigir a quem, come correctamente com os talheres à mesa... No outro dia ouvi-a repreender a filha por não ter agradecido à enfermeira que lhe foi medir a tensão à noite.

É assim que se reconhecem os optimistas! É assim que se percebe que esta mãe não perdeu a esperança e acredita a cada momento que a filha vai conseguir. Como podemos nós não acreditar?

Seja como for, em qualquer circunstância, vai sempre valer a pena ter lutado!

terça-feira, 3 de julho de 2012

[irmãos de sangue] doar medula óssea


Há tempos uma amiga minha, filha de pai sueco e mãe açoriana comentava que uma das coisas melhores que os seus pais tinham feito fora construir uma família grande. Dizia ela, com muita graça, que, dada a improvável combinação de genes, se alguma das irmãs viesse a precisar de um transplante de medula, achava mesmo que só elas próprias poderiam ser compatíveis entre si...

Portugal, felizmente, é o terceiro país do mundo com maior proporção de dadores de medula óssea relativamente à população total do país, logo depois da Alemanha e de Israel. É um número que atesta a nossa capacidade de mobilização e generosidade, um número para nos orgulharmos!

Por isso, à medida que o número de dadores aumenta, é como se o número de apostas no euromilhões se multiplicasse. Ganhar torna-se cada vez menos improvável. E o improvável às vezes torna-se possível!

E quanto mais parecida for a origem do dador, mais provável é a combinação de genes ser vencedora. Por isso, mais uma vez, pedimos à comunidade Cabo-Verdiana residente em Portugal que se mobilize. Doar medula não custa mais do que tirar sangue, é um acto de generosidade que pode salvar a menina linda que temos nos braços!

Obrigada a todos os que nos têm ajudado a divulgar esta iniciativa.

[sns we can!] não podemos deixar que o serviço nacional de saúde termine assim!

A menina da Febre dos Fenos hoje falava assim:


«Estou tão contente com esta história dos ordenados dos enfermeiros! É que a minha mulher-a-dias anda a tirar a licenciatura em enfermagem. Assim que ela passar a ser enfermeira, vou poder passar a pagar-lhe 4 euros à hora em vez dos 6,5 + subsídio de férias e de natal que pago agora. E se me aleijar, ainda lhe posso pedir para me fazer um curativo. Que máximo!

Se os enfermeiros ganham isto, então os administradores dos hospitais devem ganhar o quê, para aí uns 800 euros brutos, não?

Espero que o senhor ministro da saúde nunca tenha de ir a um hospital, porque se fosse eu, desinfectava-lhe as feridas com álcool e sal grosso.»

segunda-feira, 2 de julho de 2012

[as melhores do serviço de urgência] diagnósticos olfactivos

Ontem de madrugada, na urgência, tinha acabado de diagnosticar uma anemia por carência em ferro a um menino de 18 meses e tentava identificar a causa para perceber se o podia enviar para o médico assistente ou se tinha de o enviar para uma consulta no hospital.

Os pais, jovens e visivelmente cansados àquela hora da madrugada, faziam um esforço conjunto para responder a todas as minhas perguntas. Mas, por mais que perguntasse, não conseguia encontrar causa nenhuma. Às tantas, o pai começa a contar-me algo que o inquieta:

- Doutora, já que estamos aqui, posso fazer-lhe uma pergunta?
- Sim, claro!
- É que quando ele vem do jardim infantil, às terças e quintas, que são os dias em que come papa, a barriga dele vem sempre enorme, vê-se que ele está enjoado e às vezes arrota com um cheiro horrível... No outro dia só me parecia que tinha engolido um zombie.
- Como?
- Parecia que tinha comido um zombie! Quer dizer, doutora, eu nunca cheirei um zombie, mas se cheirasse era assim! Era um cheiro mesmo fétido, assim como se fosse uma coisa morta...
- Pronto, pronto, já percebi, vamos marcar consulta para a semana...