segunda-feira, 3 de novembro de 2014

[as melhores do serviço de urgência] foi por um triz!

Serviço de Urgência, a noite avança madrugada adentro. No ecrã do computador aparece um nome e uma idade: lactente de três meses e, embora para o caso pouco interesse, do sexo feminino. Imagino-a na chegada, vestida de rosa carregado das botinhas à touca.

Sua mãe entra, esbaforida, no corredor da urgência, gritando: "Por favor, por favor, é uma emergência!".

Todos saímos rapidamente dos gabinetes para acudir ao corredor da triagem. A número dois da equipa, neste caso esta vossa humilde serva que se assina beijo-de-mulata, de arraiais assentes desde o início do turno no gabinete mais próximo da triagem, foi a primeira a chegar, igualmente esbaforida. A última vez que ouvi este grito, a criança tinha uma septicémia e foi direta para os cuidados intensivos, onde lutou heroicamente pela vida durante semanas.

A bebé, cuja mãe gritava com voz de juízo final, dormia tranquilamente o sono dos justos. "O que se passa, mamã?", perguntamos com calma, habituados a estas andanças. A mãe, vendo-me de estetoscópio ao pescoço, ignorou olimpicamente toda uma equipa de enfermagem que a rodeava em seu auxílio e declarou-me dramaticamente: "Doutora, a menina tem um cabelo MEU enrolado no dedo! Já lá deve estar há uns três dias e a ponta do dedo está a ficar inchada!" (Suspiro... Controla-te beijo-de-mulata, a vida é curta demais!) "Tenha calma, mãe, os senhores enfermeiros vão ajudá-la."

Viro costas e volto calmamente para o meu gabinete. Mais ao longe ainda oiço a mãe perguntar, enquanto o enfermeiro com uma tesourinha corta o cabelo enrolado à volta do dedinho da princesa: "Enfermeiro, acha que a médica demora a chamar? Ai que eu acho que morro! Acha que o dedo se salva?"

Mas porquê, meu Deus?

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