sexta-feira, 28 de março de 2014

[as melhores do serviço de urgência] um problema numa tromba

- A senhora é saudável?
- Não, o meu médico diz sempre para eu nunca me esquecer de dizer que uma vez tive um problema numa tromba.
- Ah, mas isso não tem muita importância para o menino, deve ser mais é quando vai ao Ginecologista.
- Não, mas ele diz-me para dizer ao pediatra.
- Ah, mas e foi antes ou depois da gravidez?
- Não, foi durante.
- Teve uma gravidez fora do sítio?
- Não, foi na gravidez do João, a única que tive.
- Mas como é que foi?
- Um dia a perna começou-me a inchar muito, a ficar muito quente e eu cheia de dores.
- A perna?
- Sim, a perna. E depois fui logo para o hospital e diagnosticaram-me uma infeção da tromba venosa. Tive de andar a tomar muitas injeções na gravidez...

[Ah, valha-me Deus, uma trombose venosa!]

quarta-feira, 26 de março de 2014

[as melhores do serviço de urgência] ele está a fazer temperatura...

- O menino tem febre?
- Sim.
- E qual foi o máximo que teve?
- Foi para aí… trinta e tal.
- Mas tem de medir, mãe!
- Eu medi, mas não tenho termómetro.
(Suspiro)
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- O menino teve febre hoje?
- Sim.
- De quanto?
- Tinha 37ºC, Doutora, quase 40!
(Suspiro)
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- O menino tem tido febre nos últimos dias?
- Sim, doutora.
- E o corpo fica quente?
- Não, é febre só… O corpo não aquece…
(Suspiro)
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- A menina tem tido febre?
- Sim, doutora, tem estado muito molinha, transpira muito e não come. Mas ponho-lhe o termómetro e não acusa… Será febre interior?
(Suspiro)

segunda-feira, 24 de março de 2014

[vozes brancas] são metáforas, senhor, são metáforas!

"Ninguém compreende a minha bichinha", lamentava-se a mãe de uma princesa esta tarde na consulta. "Calcule doutora, que a minha empregada me ligou no outro dia a dizer que a Maria [nome obviamente fictício] se estava a queixar das pernas. E como a doutora sabe, da última vez que ela se queixou das pernas acabámos no hospital internadas com uma púrpura. Fui de charola para casa e dei com ela a correr e a pular, muito bem disposta e surpreendida por me ver".


"O que tens, filhota?", perguntara-lhe. "Nada, mãe, eu não estava a fazer nada, eu portei-me bem!" "Sim, querida, eu sei que te estavas a portar bem hoje, mas a tia Céu chamou-me porque estavas a queixar-te das pernas." "Eu?! Não, eu só disse que tinha tosse nas pernas." "Tosse nas pernas?" "Sim, mãe, quando eu corro fico com tosse!"


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- E depois é isto, doutora! Não hei de eu andar meia louca! Tenho uma filha a quem tudo acontece, um marido que está fora e uma empregada completamente histérica!
- Bem, olhe, mas em contrapartida tem uma filha poetisa! Não lhe corte essa veia poética, que tem futuro! Quem me dera a mim escrever assim...

terça-feira, 18 de março de 2014

[querida futura mãe] filhos felizes



Eu vejo todos os dias que não é fácil... Mas é possível!

segunda-feira, 10 de março de 2014

[músicas para o baby-de-mulata] eu tinha quatro patinhos



Foi com esta música que ensinei ao baby-de-mulata que há palavras e palavrões. Palavras que se podem dizer em todo o lado e palavras que só se podem dizer em casa... Um dia, estávamos muito bem dispostos e ensinei-lhe esta música com a letra adulterada (ver abaixo). Riu-se imenso mas rapidamente percebeu que fora de casa, no jardim, no supermercado, no hospital da mamã e locais afins levava com o meu olhar furibundo nº 3 só de esboçar os lábios para a e palavra e só tinha autorização para cantar a versão original... De vez em quando há alguém que lhe ensina mais uns palavrões e agora é muito mais fácil explicar que essas palavras pertencem à mesma categoria que a música dos "Quatro patinhos que cheiravam a chulé"...

"Eu tinha quatro patinhos
Ai, eu tinha quatro patinhos
Que cheiravam a chulé!
Que cheiravam a chulé!
Vieram para o nosso lago,
Ai, vieram para o nosso lago,
Vieram lavar o pé,
Ó saricoté, ó saricolá
Ai vieram de lá para cá,
Ai vieram de lá para cá!"


[as melhores do serviço de urgência] it runs in the family


Poderá ser esta, a dita árvore?




Ouvido de passagem na urgência, de uma mãe absolutamente verborreica, com um discurso tipo fuga de ideias:


- Ele tem dislexia e hiperatividade. Sabe, doutora, a árvore ginecológica também não ajuda...


Ora aí está, quem sai ao seus...

domingo, 9 de março de 2014

[atualidades] parentalidades

No outro dia, na consulta de uma criança de 4 anos que vinha por um atraso de desenvolvimento da linguagem, o pai do menino, juiz de profissão, perguntou-me assim, casualmente, enquanto eu o mandava despir e palpava a barriga, o que é que eu achava sobre a adoção por casais homossexuais e sobre a lei da co-adoção... Fiquei siderada! Era bom que a pergunta não resultasse de uma qualquer associação de ideias perversa, iniciada quando o mandei tirar a roupa do menino. Fiquei desconfortável e devolvi a pergunta com um ligeiro sorriso:

- Por que me faz essa pergunta?

A última coisa que eu queria naquele fim de dia era discutir questões de princípios, argumentar e contrargumentar com alguém que não conhecia bem, sobretudo sobre assuntos que para mim são óbvios e simples. Tanto mais que a criança tinha vários problemas muito mais urgentes de discutir do que o sexo dos anjos (ou, com maior propriedade, o sexo de seus pais). Mas quem é que no seu perfeito juízo tenta discutir questões deste calibre em plena consulta do próprio filho, valha-me Nossa Senhora do Bom-Senso!

- Ah, Doutora, desculpe, eu sei que a consulta é do meu filho, mas ando há que séculos para lhe perguntar isto porque no outro dia tomei uma decisão e não fiquei totalmente convencido... Tinha um menino que foi vítima de maus tratos por parte da mãe. Quando houve a denúncia foi hospitalizado e depois era preciso tomar uma decisão: ou bem que era institucionalizado ou ficava a viver com um tio que era homossexual e vivia com um companheiro.

- E que decisão tomou que o ficou a atormentar?

- Decidi entregá-lo ao tio.

- Mas esse tio não foi avaliado por um psicólogo ou um psiquiatra? Ou pelo menos um assistente social? O mais importante é saber se a pessoa a quem se entrega a criança é organizada do ponto de vista mental, se está disponível para acolher a criança e se tem capacidade para estabelecer uma boa relação com o menino.

- Foi isso tudo. E a assistente social e a psicóloga garantiram-me que ele tinha uma boa relação com o miúdo e o miúdo com ele.

- E então, que dúvidas teve?

- E a Doutora não teria dúvidas?

- Não, não estou a ver a razão da sua preocupação, de facto...

- Ok, doutora. Eu era contra, totalmente contra o direito de casais homossexuais adotarem crianças. Mas é curioso que neste caso eu também não tive dúvidas... Mas custou-me imenso tomar esta decisão. A doutora concorda?

- Claro! Ainda bem que conseguiu distanciar-se da sua própria opinião pessoal!

- Pois foi, doutora! Mas o que era a minha opinião comparada com a felicidade daquele menino?

Ah, grande homem! Dizem que só os fracos não mudam de opinião e este, apesar de pouco esclarecido nesta matéria, soube tomar uma decisão tendo em conta o superior interesse da criança! Dei-lhe os parabéns pela decisão difícil e descansei-o quanto ao facto de as crianças criadas por casais homossexuais não terem mais problemas psicológicos ou de desenvolvimento que as outras. E por ali ficámos, que ainda tínhamos entre mãos um caso igualmente difícil...